Nove ratinhos nasceram numa só ninhada no porão escuro de uma casa onde moravam nove velhinhas que cuidavam de nove galinhas. As velhinhas eram muito supersticiosas e acreditavam que quando uma delas morresse e o número nove fosse desfeito, a paz e a tranqüilidade não mais reinaria naquele lar onde o nove era um amuleto. Nove colheres, nove garfos, nove facas, nove cadeiras, nove xícaras, nove gatos, nove escovas de dente, nove camas, nove... nove... nove...
Suas visitas eram agendadas sempre obedecendo a regra. Cada uma só poderia receber uma única pessoa por visita e todas no mesmo dia e no mesmo horário, totalizando nove visitadores por vez. Caso houvesse uma desistência, cancelamento geral.
As velhinhas nunca souberam e nem poderiam saber que coincidentemente nove ratinhos nasceram em seu porão. Se soubessem, certeza que cuidariam para que suas vidas fossem preservadas com afinco. Do lado de fora da casa, os nove gatos salivavam com o cheiro forte de carne nova. Mas o porão era fechado a nove chaves e não havia buracos grandes em que pudessem entrar e se deliciar com a ninhada. Os dias foram passando e os ratinhos cresceram um pouco.
As nove eram muito religiosas e apegadas a diversos santos. Passavam tardes e noites orando. Dois detalhes as diferenciavam de outras senhoras. Primeiro, cada uma era devota de nove santos distintos e a eles faziam seus pedidos fervorosos. Segundo detalhe, o pedido feito aos nove santos. Desejavam a mesma e única coisa: que a morte viesse o mais breve possível e as levasse.
Mas elas não queriam morrer juntas, não era esse o desejo. Era morrer primeiro, era ser a primeira a morrer, pois enquanto as nove estivessem vivas, não teriam problema algum, mas a partir da morte da primeira, o caos se instalaria na casa para as outras e toda espécie de pestilências e mau agouro cairia sobre as oito. Apenas uma delas teria o privilegio de morrer tranquilamente: a primeira.
Um dos ratinhos nasceu cego. Vivia perdido no ninho e vez ou outra era pego pela mãe andando perdido pelo porão e seus pequenos buracos. Numa dessas andanças ele foi parar na cozinha onde as nove velhinhas tomavam seu café da manhã enquanto um dos gatos, o mais distraído, dormia embaixo da mesa. Andando pra lá e pra cá, o ratinho meio tonto - pois tinha apenas poucos dias de vida e nenhuma facilidade em identificar o mundo onde foi jogado - ficou tentando identificar algo familiar.
Uma das velhinhas levantou para pegar um copo de água no filtro e sem querer pisou no ratinho, escorregou, bateu com a cabeça na quina da mesa, caiu e morreu. O gato acordou com o barulho, percebeu os restos do pobre infeliz e saiu lambendo o que sobrou daquele saboroso café da manhã frente ao desespero das outras oito velhinhas condenadas por nao ter sido a escolhida pela morte que resolveu passar pela casa às nove horas, nove minutos e nove segundos do dia nove do nove de dois mil e nove.
Autoria: Everson Bertucci
2 comentários:
haha
Gostei bastante do conto. Bem criativo. Mas tenho duas observações:
- Que velhinas mas FDP querendo morrer primeiro para ferrar com as outras hauhauhau
- E como que um ratinho recém nascido e cego chega a cozinha da casa, visto que os gatos não tem acesso físico ao local onde estão...isso por que estou desconsiderando o fato de ele ter vencido vários degraus do porão até o "térreo" ^^
Mas o texto ficou legal :D
Elas nao queriam ferrar com as outras. Somente nao queriam ser as ferradas. É diferente. Em relaçao à segunda questao, dei uma esclarecida no texto. Brigado!
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