A boca que precede o primeiro beijo. Esta é a primeira imagem de “Saliva”, de Esmir Filho. Primeiro se conhece a boca, a protagonista da história. E a partir daí passamos a acompanhar sua dona, uma menina de doze anos que está prestes a passar por uma das experiências mais instigantes e fundamentais na vida de uma pessoa.
O espectador é convidado a se colocar no papel da jovem que está vivenciando um momento que para quem já passou pela experiência a acha tão simples e, por vezes, banal, mas que para Marina, a menina em questão, é algo que a está consumindo.
Marina se vê rodeada por medos, angústias, expectativas que toda pessoa passa. Uns com grande intensidade, outros, nem tanto. Um misto de sensações ainda não experimentadas e que não lhe é familiar, nem habitual. Suas amigas tentam auxiliá-la nesta experiência.
Poderia ser mais um dos inúmeros filmes rasos sobre o universo adolescente, seus clichês e afins, não fosse a apresentação lúdica do contexto, como opta a direção, sem cair no lugar comum, tampouco no ridículo.
Quase impossível não se divertir e se identificar com a personagem. Quem nunca se viu treinando o primeiro beijo, seja com uma laranja, uma maçã, no próprio braço, numa lâmpada, no espelho ou num outro objeto qualquer que possibilite tal façanha?
Quem acompanha Marina, passa a vê-la por dentro, através de suas sensações sendo exteriorizadas. Tudo passa a ter uma dimensão gigantesca. Seus sensores estão à flor da pele. Os sons, os movimentos, os espaços e os gestos ganham uma outra proporção, que não a real. Para Marina, tudo está modificado, lento, microscópico.
Ela está disposta a passar pela experiência do primeiro beijo, mas não consegue disfarçar a timidez e o nojo, afinal será seu primeiro contato com a boca de outro. E tudo se torna salivação.
A sensação interior se dá pela saliva que cai e empoça no chão. Seja na cena em que Marina e o menino que a beija estão com seus tênis cobertos de saliva ou quando os dois aparecem ensopados. Sem falar na leveza que geralmente sentimos quando damos o primeiro beijo. Aquela impressão de que estamos passeando pelas nuvens, que o chão nos foi tirado subitamente. Tal sensação silenciosa e única é transposta através de um jogo metafórico e paradoxal.
Autoria: Everson Bertucci
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