quarta-feira, 13 de maio de 2009

ESPOSA CONSUMISTA, ESPOSO FALIDO

Não sei se minha mulher é muito boa em me preparar armadilhas ou se sou um homem muito fácil de enganar. O prazer dela é acabar com o meu, principalmente quando é dia de futebol e cervejada. Eu sempre prometo nunca mais pisar na rua Oscar Freire em sua companhia. Uma das besteiras que fiz foi verbalizar esta afirmação a ela numa de nossas discussões.

É muito difícil dizer não a uma mulher, principalmente quando ela é dona de uma beleza hipnotizante casada com um poder particular de persuasão e uma capacidade única de me satisfazer sexualmente. Toda vez que ela vem com seus métodos femininos e me conduz até à rua Oscar Freire, ouço uma voz me dizer “prepare-se para ser devorado, mestre dos idiotas”. Não sei se essa voz é muito tímida e retraída ou se faz inexistir perto do turbilhão de frases e bondade advindas da minha tão falante esposa.

Vira esquina daqui, dali, de acolá... Quando vi, estávamos na Oscar Freire. Entramos numa loja de perfumes e ela quis sentir o cheiro de todos. No fim, saí intoxicado. Minha mente mal respondia. Passamos em frente a uma loja.

-- olha, que vitrine bem preparada! Veja aquele jogo de luz como valoriza o tom de cada vestido. Não é admirável essa capacidade que os vitrinistas têm? Ah, se eu tivesse mais tempo livre, com certeza, seria vitrinista. É de uma precisão quase divina. Eu fico me imaginando rodeada de todos esses objetos e tendo que escolher a maneira mais adequada de colocá-los para melhor atrair os olhares dos clientes. Não é fascinante?

Mal soltei um resmungo.

-- adoro quando você concorda comigo. Sou mesmo uma sortuda por ter um marido tão especial.

E fala com uma convicção e doçura que no momento me parece a coisa mais inofensiva do mundo.

-- vamos entrar por um minuto pra gente dar uma olhadinha mais de perto, amor?
Eu nunca consigo responder.

-- olha o deslumbre desse vestido, querido. Não é um fascínio?

Ao me ver, o detector de grandes idiotas que o vendedor tem é acionado.

-- deve ficar perfeito em você, diz o vendedor à minha esposa.
-- você acha?
-- não tenho a menor dúvida, complementa o vendedor.
Estava armada a arapuca.

Já vestida...

-- nossa, amor, que coincidência esse vestido ter ficado perfeito no meu corpo. Você viu que vendedor simpático?! Ele tinha razão, ficou ótimo!

Não sei se era o fato dela estar bem vestida, feliz e com pose de mulher fatal ou se era o efeito alucinógeno dos perfumes, ou ainda, a fato dela viver falando sem parar... o fato é que todos os zeros das etiquetas se tornaram inexistentes pra mim. Não conseguia ouvir, nem ver, nem pensar.

-- dois mil e duzentos reais, amor! Nunca vi um vestido tão barato!
-- nossa, barato mesmo! Vinte e dois reais e um bom preço para se pagar num vestido, minha querida.

Este era o efeito.

E lá vieram os sapatos, as bolsas, os cintos... rindo e conversando diretamente comigo. Eram os seres mais encantadores e simpáticos do mundo. Tudo do mais fino, sofisticado e caro. Passo o cartão de crédito e saímos felizes, rumo ao carro.
No caminho, sinto-me raciocinando novamente. Medo. Tento não acreditar na quantidade de sacolas que estou carregando. No rosto da minha esposa a felicidade transborda. Era o sinal. Ela conseguiu de novo o que queria. O efeito tóxico dos perfumes estava passando, minha esposa já não falava tanto e o efeito hipnótico estava findo.

Eu pensava, “minha querida, não esqueça de achar um eufemismo bem bonito para foi um trouxa ao mandar escrever a última frase do meu obtuário”.
-- está tão calado, querido! O que foi?
Autoria: Everson Bertucci

quinta-feira, 7 de maio de 2009

HORÓSCOPO DE QUINTA - POR MADAME CHARLA

O único Horóscopo que dá azar ler só o seu. Aqui é obrigatóra aquela olhadela no signo do vizinho. Toda quinta: o que dizem os astros à Madame Charla sobre os signos do zodíaco. Sempre dois por vez

SAGITÁRIO
Se a sua vida está um cocô, não se desespere. Um planeta, que não sei identificar qual, transita sobre seu signo, isso significa mudanças. Analise seus atos e aprenda com suas falhas, e não fique se achando a pior pessoa do universo. Existem pessoas bem piores, eu, por exemplo, conheço umas... duas.


TOURO
Ai, amiga taurina, eu sei que você está louca atrás do verdadeiro amor, mas é com muita dor e tristeza que eu digo que teu príncipe nem sabe da sua existência e que nem cavalo branco ele tem. Portanto, bem, trate de se ocupar com alguma coisa útil, antes que suba para a cabeça, tá?

Ilustraçao: Flávio Leal

quarta-feira, 6 de maio de 2009

O DIÁRIO DE ALICE - EPISÓDIO 45 - recomeço

Hoje talvez seja o dia mais difícil da minha vida. Não, diário, não é drama. É sério. Hoje é o dia que eu escolhi para morrer. Quero muito lhe pedir que me perdoe. Não quero que fique triste, apesar de ser o único que sentirá minha falta. E então, “perdoa eu”? Primeiro diz se perdoa, depois lhe digo do quê. Perdoa? Brigada! Queria que me perdoasse a arrogância, a intolerância, a grosseria.... espera, diário, ainda não terminei. Que me perdoe por toda a prepotência e egoísmo. Quero que saiba que graças a ti, a minha vida se transformou... e eu acho que foi pra bem melhor. Você me fez querer ser uma pessoa melhor. Isso não tem nada a ver com gentileza, você vai entender o por quê. Para que eu consiga voltar à vida, preciso abandonar esta, preciso deixar de escrever e viver. Apenas viver, diário. E agora o verdadeiro pedido de perdão: infelizmente para abandonar esta vida, terei de abandonar você. Por favor, não chore, eu já decidi. Por mais que isso me doa. Oi? Eu também, eu também te amo, diário. Mas terei de fazer uma coisa que vai me dilacerar. Para que este meu “eu” possa morrer... diário... terei de matá-lo. Minha morte se dará através de ti. Eu sei que é covardia. Talvez eu não saiba ser de outro jeito, mas vou tentar.... eu prometo.


Lentamente, ela arranca folha por folha do diário e, aos prantos, as queima.

terça-feira, 5 de maio de 2009

O DIÁRIO DE ALICE - EPISÓDIO 44 - descoberta

Acabo de voltar de uma viagem muito triste. Lá eu descobri que não sou mais aquela menina sonhadora que ia revolucionar o mundo. Que eu não tenho mais o brilho forte no olhar, nem a sede da mudança. É muito triste descobrir que se é muito pequena. O tempo passa e com ele a gente cresce. Logo eu que sempre quis crescer. Foi assim que voltei de dentro de mim, com essa deficiência... descobri também que... eu... boa noite, diário!

segunda-feira, 4 de maio de 2009

O DIÁRIO DE ALICE - EPISÓDIO 43 - transiçao

No terceiro encontro... não importa. Nem o terceiro e nenhum outro. Preciso parar de pensar no que não foi, parar de vivenciar o passado, parar de me martirizar, de achar que o erro foi meu. Preciso encontrar uma maneira de voltar a viver e parar de viver em função de uma coisa que não aconteceu. Por favor... me ajuda, diário.

sábado, 2 de maio de 2009

O DIÁRIO DE ALICE - EPISÓDIO 42 - sonho

Acabo de acordar de um sonho triste. Sonhei que era feliz.

Autoria: Everson Bertucci

sexta-feira, 1 de maio de 2009

O DIÁRIO DE ALICE - EPISÓDIO 41 - engano

No segundo encontro eu estava no auge da ansiedade. Dominada pela vontade de encontrá-lo e ao mesmo tempo a possibilidade de ter me iludido e tudo não ter passado de apenas uma construção imagética. E dentro de mim o fantasma que sempre me persegue: o medo da rejeição. Felizmente, foi perfeito, diário! Não houve ilusão, nem rejeição... pelo menos não naquele momento.

Autoria: Everson Bertucci