terça-feira, 9 de dezembro de 2008

UM GRITO DE SILÊNCIO

Hoje, me sinto estuprado no modo que há de pior: na minha inteligência. Que inteligência!? Se fosse inteligente, não teria deixado chegar onde chegou. Teria feito outro caminho – havia tantas possibilidades! Se fosse inteligente, faria desnecessárias estas linhas. Estupraram a minha dignidade e a deixaram estraçalhada, jogada no mais ínfimo buraco. Fizeram do meu ouvido um poço de descarga verborrágica hipócrita... e eu, na minha capacidade de acreditar em anedotas, deixei me levar. E por acreditar na mudança... fui deixando cada vez mais.
“Ah, idiota!” - uma voz me dizia ao fundo. Mas eu não quis dar ouvidos. E esse jogo verbal me seduziu e explorou tudo o que havia de melhor em mim – tudo bem que não havia grande coisa – canalizando todas as minhas energias para o que eles queriam.
Estupraram a minha capacidade de pensar, (parece mentira, eu sei) pois era tanta informação que recebia - que meu pensamento - na sua incapacidade de administrar, puxou o piloto automático. Estupraram a minha capacidade de me relacionar. Na ânsia de produzir pra eles, me afastei dos meus e impedi que outros chegassem. O Muro de Berlim se reduziria a nada perto daquele que eu construí.
Estupraram a minha capacidade de falar. Minha fome era tanta, que me contentei com migalhas – dessas que jogam aos pombos famintos. Estupraram minha capacidade visual. Me fizeram ver o que eles queriam que eu visse. Eu até relutei no começo... mas eles foram mais rápidos: pintaram paisagens.
Quando digo que me estupraram no pior sentido que existe é porque se fosse um estupro convencional, eu teria esperança de recuperação. Eu teria no que me apegar para continuar. Felizmente, não conseguiram estuprar minha capacidade de indignação. Essa eles não conseguiram. “Mas de quê adianta?”. Ela sozinha não é nada. Sozinha, é um ponto perdido nesse faminto universo... é o que restou de mim: o silêncio.

Autoria: Everson Bertucci

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